A morte prematura de Tony Hsieh no fatídico e já inesquecível ano de 2020, que levou tantas e tantas vidas, abre margem para muitas reflexões.
Filho de imigrantes Taiuaneses, nasceu em Illinois e viveu em San Francisco a partir dos cinco anos de idade. Graduado em Harvard e com uma mentalidade à frente de muitos jovens do seu tempo, Hsieh construiu um legado inovador sem precedentes e marcou a história do empreendedorismo e do atendimento ao clientes em níveis mundiais.
Primeiro, construiu uma empresa que foi comprada pela Microsoft por USD 265 milhões. Depois, criou uma das maiores referência em criar experiências de impacto aos clientes. Afinal, não é qualquer e-commerce de sapato que te ajuda a comprar uma pizza, certo? A Zappos é hoje estudo de caso para qualquer companhia do mercado que atue com atendimento de excelência, bem como para empresas que acreditam na holocracia.
Autor do livro Delivering Happiness, Hsieh tinha, de alguma maneira, uma essência diferente, especial. Estava na lista de pessoas com quem eu adoraria passar uma tarde inteira conversando e perguntando um milhão de coisas pra tentar entender só um pouco do que havia dentro de sua cabeça.
Um cara que, com uma fortuna de 840 milhões de dólares, vivia em um trailer e acreditava que seus momentos mais felizes não tinham sido proporcionados pelo dinheiro. Alguém que era feliz buscando cultivar a felicidade do outro, mesmo que por meio das relações comerciais.
Aos 46 anos, ele viu sua jornada chegar ao fim vitimado por um incêncio na casa de Rachael Brown, amiga e funcionária da Zappos a quem visitava durante o período em que havia ido para Connectcut visitar a família no feriado de Ação de Graças. Alguém que fez tudo isso, mas ficou preso no porão e foi vitimado pelos ferimentos do fogo e da fumaça depois de 9 dias no hospital lutando pela vida.
Alguém que construiu fortunas e não se rendeu à elas. E que, sem esposa ou filhos, deixou um legado valiosíssimo para o mercado mundial e muitas gerações.
E que se foi, de forma tão brutal e inesperada. Para nos lembrar que somos, todos, apenas humanos.
Enquanto isso, na outra ponta, há inúmeros empresários questionando funcionários que bebem mais de um café por dia e preocupados em quanto prejuízo isso pode trazer ao seu negócio, sendo que ele nem mesmo oferta benefícios além dos obrigatórios previstos por lei e não acredita que clima corporativo seja relevante para a saúde do colaborador. Esse mesmo cara já viajou para os Estados Unidos e comprou um par de sapatos na Zappos enquanto estava por lá, porque não queria perder tempo indo ao outlet. Provavelmente sonega parte dos impostos em seu imposto de renda e acha que a obrigação de manter a casa em ordem e os filhos na linha é da esposa. O vizinho dele, por sua vez, trabalha gerenciando uma rede de vendedores de perfumes falsificados. Paga o mínimo para a equipe e gasta o lucro que fica no bolso em bebidas, cigarros, mulheres e carros. Não é a toa que ele tem um BWM e o empresário um Honda. Toda vez que ele pega seu BMW pra sair, costuma jogar a bituca na calçada da vizinha. ela já cansou de pedir com jeito que ele não faça mais isso, mas ele não se importa. Ela é só uma velha morimbunda fazendo hora extra na vida, de acordo com as palavras dele. Sempre que ouve isso, ela não se irrita e volta para dentro, senta no sofá, liga a televisão e retoma seu crochê. enquanto as mãos trançam os pontos, sua mente divaga pelo passado, quando lembra os tempos em que trabalhava na fábrica de tecidos da cidade em turnos dobrados para ajudar na renda familiar. Desde jovem ela era trabalhadora. Primeiro na roça, e depois na fábrica. E não tinha moleza. Era trabalho duro, sem intervalo para cafés ou cuidados com postura, peso ou todas essas coisas que as empresas de hoje colecionam em listas e mais listas de qualidade de vida no trabalho. Ela lembra disso e então pensa no neto, que passa o dia todo em frente ao computador no mesmo tipo de escravidão que ela cumpria na fábrica, só que com uma finalidade diferente. A diferença é que ela sabia aproveitar a vida quando o trabalho terminava. Mas ele continua no computador o tempo todo mesmo quando o trabalho termina.
Tantas e tantas conexões interligadas por fios tênues e que guardam entre si a mesma coisa em comum: todos somos humanos e temos uma vida finita, limitada, certa de findar um dia. O que não sabemos é quando, como ou onde. E em 2020 poderíamos contar inúmeras histórias de vidas perdidas, como a de Tony Hsieh. Elas provavelmente precisariam de mais do que uma biblioteca inteira para serem arquivadas. Um ano avassalador, em que ouvimos quase mais histórias de mortes do que de nascimentos.
Todos os dias isso nos faz lembrar mais e mais que a vida acontece hoje, agora, aqui, no momento presente. O amanhã é uma caixinha de surpresas incerta e invisível.
Tony Hsieh se foi e deixou o seu legado para o mundo. Qual legado VOCÊ quer deixar?…