“Uma pessoa é tanto mais autêntica quanto mais se parece
com aquilo que ela sempre sonhou para si mesma…”
Até que ponto estamos aptos a julgar as atitudes do outro?
É sobre esse dilema que o diretor Pedro Almodóvar constrói “Tudo Sobre Minha Mãe”, filme que conta a história de Manuela, uma mulher que após passar seus últimos anos dedicada à uma estável carreira de enfermeira e sólida (porém incompleta) vida familiar, perde seu filho em um acidente de carro na noite de seu 17º aniversário, e decide enfrentar o passado do qual fugiu por tanto tempo para cumprir uma promessa feita à ele no dia de sua morte: ela parte em busca do pai do Esteban, o travesti Lola, para contar-lhe sobre a existência do filho.
Através de uma trama envolvente, Almodóvar entrega um filme sensível, repleto de pequenas mensagens delicadas e sutis, mas profundamente verdadeiras. Ele constrói uma história baseada em cores, dramas e sensações, que mexe com os sentidos do espectador. Essa característica é típica do estilo “almodovariano”, um estilo que busca exatamente trabalhar os sentimentos do público e sua capacidade de sensibilidade e reflexão.
Com essa construção, o diretor faz uma abordagem acerca de vários assuntos que são polêmicos, mas que retratam claramente a realidade cotidiana, presente nos pequenos detalhes da vida.
Logo no início, ele aborda o reflexo da personalidade feminina na sociedade. O jovem Esteban, filho de Manuela, esclarece sob seus pontos de vista, a diferença de um filho criado unicamente pela mãe, que tende a adquirir uma personalidade mais séria, justificando seu gosto pela leitura e o ávido desejo em tornar-se um escritor. É justamente nessa busca que ela irá deparar-se com mais personagens marcantes, entre elas, o travesti “Agrado”.
Agrado justifica seu nome por ter passado a vida toda tentando “agradar” aos outros, e é dela a frase “uma pessoa é tanto mais autêntica quanto mais se parece com aquilo que ela sempre sonhou para si mesma”. Isso ela comprova em todas as suas ações, dando uma nova perspectiva de vida ao espectador. Essa é outra característica constante na criação de Almodóvar: ele baseia sua trama, sobretudo em seus diálogos.
É Agrado quem apresenta à Manuela a irmã de Rosa, que está grávida de Lola, mas encontra-se em estado grave por causa da AIDS, e precisa ainda lidar com a mãe conservadora e superprotetora. É Manuela quem dá apoio á Rosa durante a gestação e que cuidará de seu filho (também chamado Esteban) após sua morte.
Enquanto isso, a atriz Huma Rojo tem uma relação de pendência com Manuela, afinal, ela só se aproxima da atriz para saudar uma dívida com o filho, que teve de pagar um alto preço pelo autógrafo da estrela.
Lola (ou Esteban pai), por sua vez representa a inquietude e a complexidade do homem. É como se existissem diversas pessoas em uma só. Isso justifica sua inconstância e intensidade: a personagem tem necessidade de sentir-se realizada, mas tem consciência dos erros e atropelos que deixa pelo caminho.
O diretor apresenta ainda o outro lado social, o lado do submundo social, com todos os “defeitos” e incompreensões, dando o tom certo de realidade à história.
Com maestria, Pedro Almodóvar cria uma obra que consegue mesclar drama e comédia de forma única, captando a essência humana e a sensibilidade feminina em seus pequenos gestos, repletos de todas as suas angústias, desejos, medos e alegrias. Ele retrata preconceitos, tolerância, aceitação, homossexualismo, frustrações, perdas e ganhos. Retrata um lado mais “obscuro” da realidade, mas o faz de forma tão perfeita e natural que acaba por transformar o espetáculo em uma obra de arte inigualável. Aos poucos, ele arquiteta uma tragédia de amor materno repleta de personagens extremos, rompendo fronteiras ao retrata características e dilemas de uma sociedade real. Mas do que isso, Almodóvar está disposto a questionar os limites do homem.Um filme para ser visto e refletido, “Tudo Sobre Minha Mãe” é praticamente uma lição de vida.
lipe fonseca
30 de março de 2007 at 17:14Tengo que escribir en español sobre esta película: maravillosa! Así como todos los filmes de Almodóvar! Y Agrado es la mejor parte pues es hecho por una actriz! Maravilloso filmes!
Letícia
3 de abril de 2007 at 11:12Muy ben dito!!
Almodóvar é um grande mestre em retratar a essência dos sentimentos e emoções humanos, como raríssimos diretores do universo cinematográfico. Seus filmes não são apenas dignos de serem apreciados, mas uma necessidade à qualquer ser cinéfilo….