15 anos, 320 episódios e muitas histórias depois, Supernatural chegou ao fim. A série que marcou toda uma geração teve seu último e derradeiro episódio exibido em novembro de 2020.
É até difícil de explicar o quanto a minha relação com Supernatural vai além de apenas mais uma série que acompanhei inteira (até mesmo quando deixou de fazer sentido ou partiu pro exagero).
Descobri a série quando tinha 19 anos…. Tinha começado a trabalhar, fazia faculdade, ainda morava com minha mãe e o restante do tempo que sobrava na vida eu dedicava às minhas paixões: leitura e cinema (aqui inclua a maior amplitude da palavra). Nem me lembro ao certo como fui parar no caminho da trama… Mas eu já conhecia Jared Padalecki de Gilmore Girls e sempre fui chegada em histórias sobrenaturais, então talvez a combinação tenha sido um atrativo.
Na época em que tv por assinatura não era um luxo ao qual eu tinha acesso e streaming estava longe de existir, eu recorria ao famoso “download do mercado negro” para conferir as coisas bacanas do cinema e da tv. Lembro que quando comecei a série já devia estar ali pela metade da primeira temporada. Então devorei os primeiros episódios rapidinho quando percebi que a trama tinha mais um atrativo pra mim: dois irmãos que pegavam a estrada para caçar monstros como negócio da família.
Essa relação dos irmãos foi mais um toque especial pra me pegar de vez. Logo, não demorou pra eu apresentar Supernatural ao meu irmão e esperar que ele me alcançasse para passarmos a acompanhar os episódios juntos. Rapidamente a trama dos irmãos na tela virou um ritual de irmãos fora dela. Acompanhamos juntos os 15 anos das aventuras de Sam e Dean, lidando com desafios como mudança de cidade, distância, calendários complicados e outras coisas.
Esse ritual e o tema na séria foi ainda inspiração para nossa viagem mais marcante: uma roadtrip pela Califórnia a bordo de um motorhome. A viagem, aliás, inicialmente seria feita em um carro parecido com Baby e começaria em Dallas para que pudéssemos fazer algumas das rodovias que os irmãos cruzaram na tela. Mas tivemos que fazer alguns ajustes para nos encaixarmos ao cronograma e orçamento disponível.
Ao longo de 15 anos comprei o diário de John Whinchester. Ganhei uma caneca da série. Vimos Jared e Jensen crescerem, formarem família, construírem suas vidas e envelhecerem ao nosso lado. Acompanhamos ao lado deles cada nova ruga e cicatriz, enquanto do lado de cá as nossas também cresciam. E vimos Carry On, de Kansas, ganhar um sentido completamente novo e memorável…
Mesmo quando a história dos irmãos evoluía ou se desviava para caminhos que não faziam o menor sentido, continuávamos lá, firmes na luta, sem jamais abandonar nossos parceiros de tela. Adotamos cada novo personagem como se fosse um membro da nossa própria família. Choramos a morte (ou as várias mortes, porque morrer em Supernatural era só mais uma atividade que podia se repetir no currículo, rs) de John, Bobby, Mary, Dean, Sean, Crowley, Rowena e até mesmo de Lúcifer, entre tantos outros personagens que com passagens mais longas ou rápidas sempre marcaram algo especial.
Mas hoje foi o dia. Aquele dia que devia ter chegado há muitas temporadas atrás. Mas que não queríamos nunca ver chegar. Que desejávamos e temíamos ao mesmo tempo. Que poderia dar um fechamento digno a todo contexto ou estragar toda a jornada até aqui.
E para mim o final foi poético e correto, confirmando a essência que Supernatural trabalhou em sua longa história. Em um ano difícil como 2020, a mensagem não poderia ter sido mais real….
Castiel e seu polêmico discurso de amor para Dean pagou seu acordo sacrificando sua alma para salvar Dean de Biily (gravidíssima na reta final). E ao contrário das polêmicas, pra mim o discurso de Castiel foi e sempre será fraternal. O que Castiel encontrou em Dean como ser humano foi um exemplo do que ele gostaria de ser quando abriu mão do céu para viver sua experiência na Terra. E isso não se trata de amor de um homem por um homem, homem por mulher ou mulher por mulher. Trata-se do amor entre seres humanos, o amor fraterno, que a sociedade parece ter se esquecido que ainda existe para viver um eterno debate sobre amores hetero e homossexuais.
Depois, tivemos Chuck – vulgo Deus – que se tornou vítima de seu próprio poder enquanto a essência maior de Deus foi parar nas mãos de Jack, o molecote que nasceu filho do demo e se tornou o novo responsável por redirecionar a fé do mundo e consertar a bagunça de Chuck.
E finalmente temos os irmãos Winchester. Sozinhos, com a história maior da série solucionada, os irmãos seguem a vida fazendo aquilo que fazem de melhor: caçando. E num dia como outro qualquer, em que Dean é presenteado por um festival de tortas de manhã e a caça à um ninho de vampiros à tarde, tudo muda. Mesmo depois de lidar com o sobrenatural por 15 anos e voltar da morte algumas vezes, não foram monstros ou magia que levaram Dean. Foi a fatalidade de ser humano. Durante a luta com os vampiros, ele acaba se jogando de costas contra uma estaca. E assim como a morte age no mundo real, a vida se esvai em um instante, sem aviso prévio ou sinal de alerta. E o último pedido de Dean para o irmão é que não o traga de volta e viva sua via intensamente.
Nada poderia ter sido tão poético quanto isso. Uma morte mais real do que qualquer outra. Um acidente, um piscar de olhos, e não estamos mais aqui.
Assim como a série começou, Dean morreu fazendo o que mais gostava: caçando. E Sam tentou viver sua vida como um cara normal. Teve esposa, filhos, envelheceu… E quando partiu encontrou Dean e Baby no paraíso.
Paraíso este que, conforme Bobby nos relembra ao recepcionar Dean, tem a cara que nós desejamos que tenha.
A verdade é que eu já sabia o final antes de assistir e confesso que achei que não me emocionaria…. A morte de Castiel pra mim foi fria demais, quase vazia. Mesmo com o belo discurso, não trouxe toda emoção de sempre. O encerramento do penúltimo episódio com o flashback foi mais “nó na garganta”…. Mas ele só estava estendendo o tapete para o show de lágrimas que viria na sequencia.
Nem metade do episódio e Dean sofre o fatídico acidente. E toda aquela ideia de que não seria emocionante se esvai ralo abaixo para dar lugar à um balde de lágrimas, garganta apertada e olhos brigando pra enxergar com o óculos embaçado…
Foi difícil acompanhar a dor de Sam, suas lágrimas ao retomar a vida sem o irmão e a saudade do própria Dean enquanto não tem Sam ao seu lado no paraíso. E em paralelo 15 anos passavam como um flashback em nossa mente, nos lembrando que não teríamos mais aqueles momentos outra vez.
Ao final, uma despedida dos atores e toda equipe quebrando protocolos mostram que Supernatural não era só uma série como outras…. Era uma família de verdade que se formou por trás das câmeras e se estendia entre os fãs, atores e cada um que se envolveu de alguma forma nisso tudo. E se pra nós, do lado de cá, é difícil processar, imagina pra quem deu vida aos personagens e cresceu com eles pro 15 anos…
De todos os legados de Supernatural, ter tipo a oportunidade de construir um ritual em torno dela ao lado do meu irmão foi um dos maiores presentes. E talvez por isso aquela sensação de final de série, quando a gente se sente meio órfão e triste, seja ainda maior agora.
A noite acabou triste. O adeus marca o fim de uma era. E Carry On jamais será ouvida novamente sem gerar uma fagulha especial no coração. Mas o legado, esse jamais desaparece…
Obrigada Sam, Dean e toda família e comunidade Supernatural por terem construído juntos algo tão especial. Será difícil encontrar uma substituta à altura para este ritual…