Se você, assim como eu, também nasceu nos anos 80, faz parte da geração que viu a Seleção Brasileira glorificar o futebol como esporte nacional e levar essa paixão pelo mundo. Logo, você também está sofrendo em ter que ver o triste desempenho da geração atual e sentindo saudade dos Pelés, Ronaldos, Romários, Rivaldos, Cafus, Bebetos, Tafarels e tantos outros nomes que temos orgulho de carregar.
Somos o berço do maior jogador de futebol de todos os tempos e vimos Pelé ensinar muito mais do que apenas futebol. Ele também ensinou arte, paixão, união e dedicação. Vimos tantas e tantas gerações sonharem em ser como ele depois disso. Muitos tentaram, alguns foram bem sucedidos. E vale lembrar que nenhum deles foi perfeito! Mesmo Pelé, Ronaldo, Romário e essa galera das gerações mais novas sempre vieram à tona com fofocas e problemas fiscais ou com mulheres, brigas e tretas mil.
Da mesma maneira, como Pelé era tão único e fora da curva, elevou a régua de uma maneira que dificultou pra todos que vieram depois. Mesmo os bons representantes que tentaram manter o padrão traziam sinais do declínio. Afinal, ninguém pode negar que o Ronaldo Fofômetro Fenômeno foi um grande jogador, mas também um dos primeiros grandes nomes que despontava como o folgadão em campo, que precisava ter a bola colocada em seu pé pra fazer gol e fora isso não fazia lá muita coisa. Contudo, a partir do momento que tinha a possa da bola, ele cumpria seu papel no time! Ou aquela ajeitada de meia do Roberto Carlos que nos fez criar uma raiva histórica em plena copa do Mundo, mas que não diminuiu sua dedicação ao longo da história.
O grande problema dessa geração atual mais nova é que o dinheiro e a fama falam mais alto do que a paixão pelo jogo para muitos deles. E já vamos logo pra polêmica então que tô sem tempo pra enrolar: Neymar. É um grande jogador? Sim, o cara joga bem. Só tem um problema: joga quando quer! No começo de carreira, mesmo já bem chato, marrento e se achany o máximo, víamos esse jogo acontecer em campo. Mas à medida que o dinheiro e o estrelato aumentavam, diminuía seu empenho genuíno em campo. Ele se tornou conhecido por todos como Neymar Cai Cai, perde mais tempo fazendo fita do que criando jogadas efetivas, perde alguns gols imperdoáveis e ainda tenta manter o time (e a nação) acreditando que tudo depende dele. É verdade também que recentemente essa crença começou a mudar. Outros nomes tem se destacada e feito muito bem as vezes. Mas nem de perto essa geração tem representantes como a Seleção dos anos 80, 90 ou começo dos anos 2000.
Para quem viu o Brasil se tornar Tetra e Penta em campanhas emocionantes, acompanhar as eliminatórias da Copa este ano foi uma missão dura. Uma missão dura e traumática, porque ainda nos fez reviver traumas como perder para a Argentina em pleno Maracanã (e nem vamos falar sobre a violência entre as torcidas antes do jogo porque isso dá outro post inteiro sozinho). E nos faz ter que admitir que um argentino chamado Messi está cravando seu nome como um dos grandes jogadores da última década, apagando até mesmo o brilho de seu rival de igual nível, Cristiano Ronaldo, um português, deixando o Brasil longe do topo na história moderna do futebol de campo.
Numa campanha triste, com mais derrotas e empates do que vitórias – para uma seleção que colecionava apenas vitórias em Eliminatórias da Copa – assistimos jogos com o coração na mão. Neymar passou mais tempo cuidando de lesões e mimimis do que em campo, Richarlison (um expoente de esperança da atualidade) segue em recuperação de uma cirurgia, Martinelli se desdobra pra tentar resolver o BO que o time tem na mão ao lado de Thiago Silva, Casemiro e Vini Jr e alguns novos nomes chegam à campo com vontade para brigar, mas todos seguem assombrados ainda pela ideia de quem sem o Neymar o time não anda (mito que já passou da hora de cair por terra) e assustados e paralisados com qualquer reação inesperada do adversário (nem preciso dizer a herança que aqueles 7 a 1 nos deixou, né).
Então quando o jogo contra a Argentina começou ontem, a verdade é que já não esperávamos muito. Só não queríamos perder para os hermanos. Afinal, não seria só mais uma derrota, seria uma ferida emocional histórica. Surpreendentemente vi um time em campo bem melhor do que eu esperava no primeiro tempo. E ele seguia bem assim também no segundo tmepo até que saiu aquele gol argentino do nada. Aí o Brasil, que dominava a posse de bola até então, vestiu o trauma paralisante e desacelerou. Tentou, tentou, mas tivemos que engolir a derrota mais uma vez, com dor de estômago e um coração já quase acostumado com o sofrimento.
Quando o jogo acabou, veio a célebre frase que Chaves eternizou: “Era melhor ter ido ver o filme do Pelé“…. E era mesmo.
Então eu resolvi levar a frase a sério quando liguei a TV no dia seguinte e peguei o longa “Fuga pela Vitória” no comecinho.
Tá bom, esse não é verdadeiramente o filme do Pelé… O filme que conta sua história é o “Pelé: o nascimento de uma lenda”, e eu recomendo fortemente, porque o longo é capaz de reavivar a chama do amor pelo futebol e a admiração pelos feitos do craque em qualquer um (e uma hora faço um post só sobre essa película aqui). Mas dessa vez a história era outra (e si, Pelé participou de mais de um longa no cinema!)….
E se eu disser que estamos falando de um filme que reúne Stallone, Pelé e Michael Caine, já parece um negócio sem pé nem cabeça, tão estranho quantos os jogos atuais da Seleção Brasileira. Como eu já tinha visto os filmes sobre a carreira do Pelé, tive medo de encarar um longa maluco e decepcionante. Mas o que poderia ser mais decepcionante que o jogo de ontem, né? Só me joguei no sofá e embarquei na história.
A história, aliás, fica ainda mais bizarra do que apenas a curiosa união de estrelas que já citei há pouco, porque acontece durante o período nazista… O enredo de Fuga para a Vitória é vagamente baseado na chamada Partida da Morte, um jogo de futebol não-oficial disputado em 1942 por prisioneiros de guerra soviéticos e soldados nazistas da Wehrmacht. É isso aí mesmo que você leu!
Lançado em 1981, o filme acabou se tornando cult porque dele participaram ainda outras estrelas do futebol, como Bobby Moore, Osvaldo Ardiles e Kazimierz Deyna. É até legal porque nos créditos finais eles mostram o nome da galera e logo abaixo o país de origem de cada um. Mas como o filme se passa nos primeiros anos da ocupação alemã da França (1941 ou 1942), o personagem de Pelé, o cabo Luis Fernandez, é identificado como sendo de Trinidad e Tobago, não do Brasil (mas nos créditos sim aparece sendo do Brasil!). Os brasileiros não entraram na guerra contra as Potências do Eixo até 1943, com a Força Expedicionária Brasileira chegando à Itália em 1944. Da mesma forma, o personagem do astro argentino Osvaldo Ardiles, Carlos Rey, não é identificado como sendo de nenhum país em particular (a não ser nos créditos).
Basicamente rola o seguinte: em um campo alemão de prisioneiros de guerra, o major Karl von Steiner (Max Von Sydow), que no passado havia sido jogador da seleção alemã de futebol, tem a ideia de fazer um jogo entre a Alemanha e uma seleção composta pelos prisioneiros aliados, liderados pelo capitão John Colby (Michael Caine), um militar inglês que era um conhecido jogador de futebol.
Colby reluta a aceitar de início, mas vê uma boa oportunidade de conseguir mais alimentos e condições melhores de vida para ele e seus parceiros – que, por sua vez, enxergam uma ótima oportunidade de escapar do campo. Se juntam ao time Robert Hatch (um Stallone pré-Rambo) e o talentoso Luis (Pelé), formando uma equipe que teria tudo para vencer os nazistas – isso, claro, se a arbitragem e eventos extracampo não atrapalhassem. Para nós, brasileiros, um dos principais motivos para conferir o filme é a performance de Pelé, que além de atuar, foi o responsável por montar as jogadas que são apresentadas no filme e até aparece fazendo sua clássica bicicleta no gol da vitória final. Ele é o principal dos 18 jogadores de futebol que foram escalados para o filme.
Mas Stallone é o verdadeiro astro da história e vive um goleiro pouco talentoso. Criticando o futebol por não entender direito como funciona o esporte, logo se vê debaixo do travessão, tendo de defender os chutes potentes de Pelé e cia. Na vida real, o ator chegou a quebrar um dedo tentando parar um dos chutes do craque brasileiro.
É a dupla entre Michael Caine e Max von Sydow contudo que, em lados rivais, criam o enredo em si. Enquanto John Colby se divide entre a vontade de fugir e a necessidade de jogar, o major alemão vivido pelo sueco Sydow mostra um lado menos vilanesco, mais humano. Não se furta a bater palmas quando seus adversários fazem uma jogada espetacular, mesmo desaprovado por seus superiores e pares. O próprio Colby também é recebido com reprimendas pelos seus companheiros ao se associar de alguma forma com o inimigo, ao aceitar o jogo de exibição. Uma óbvia propaganda nazista, o jogo serviria para mostrar o poderio alemão em cima dos prisioneiros.
Enquanto os nazistas, com exceção de Steiner, planejam fazer de tudo para vencer o jogo e assim usar ao máximo a propaganda de guerra nazista, os jogadores aliados planejam uma arriscada fuga durante o intervalo da partida. E, acredite, chegam a entrar no buraco mas saem dele porque acreditam que podem vencer o jogo e voltam para o campo, desistindo de tudo que foi planejado.
É justamente então que o filme coloca na tela a paixão pelo futebol (algo que Pelé também teve a missão de levar para o mundo pós aposentadoria nos gramados brasileiros – tendo sido contratado inclusive pra isso por outros países). Quando o time está no gramado, você esquece o cenário nazista e deixa toda emoção que o futebol é capaz de proporcionar invadir sua alma. E todos os elementos estão lá. Quase-gols, faltas, ansiedade, nervosismo, torcida. Ahhhh a torcida. É dela o triunfo final. A torcida apaixonada que abraça a causa dos presos e torce por eles até o fim é justamente o herói do filme que derruba as grades no fim do jogo (muito brasileiro o sentimento nessa hora hahaha) e camufla os jogadores entre a multidão para ajudá-los a escapar do campo para o mundo, garntindo assim a Fuga através da Vitória. E só de escrever isso já fiquei arrepiada de novo….
O esporte tem essa capacidade incrível de nos fazer vibrar. E o futebol sempre teve um cantinho especial no coração dos brasileiros. Será que um dia vamos voltar a sentir essa vibração outra vez? Como na Copa de 1994 ou 2022?
Como bons brasileiros que somos, não desistimos nunca e a esperança é a última que morre. Mas não sei se a tão esperada chegada de Ancelotti será capaz de resolver brevemente um problema que já se arrasta há bem mais de uma década. A verdade é que temos uma geração complicada nas mãos (não apenas no futebol), que tentamos a todo custo proteger de não sofrer o que sofremos, mas que agora não estão prontos para encarar problemas antigos (e novos). Talvez, no fundo, todos tenhamos a nossa parcela de culpa, endeusando os Neymares da vida mais do que deveríamos, aceitando menos do que merecemos. Mas mesmo assim seguimos aqui, tentando, aguardando o próximo jogo, com o coração e aquele outro negócio de duas letras apenas na mão e desejando ansiosamente por uma vitória bonita para nos fazer vibrar novamente.
Quem sabe um dia….