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A luz do sol refletia no parapeito enferrujado da janela do segundo piso enquanto ela observava através da vidraça sem nada encontrar. Buscava desesperadamente vestígios daquele verão. O barulho das risadas, o som de passos na escada, sorrisos desmedidos e o brilho no olhar que poucas vezes alguém fora capaz de despertar-lhe. Mas o que ela mais sentia falta era de seu abraço. A simplicidade e inocência de um abraço que traduzia aquele turbilhão de sentimentos sem ter de usar palavras que apenas serviriam para confundir tudo que havia entre eles. Sentimentos jamais explicados ou questionados, que eram satisfeitos simplesmente por existirem. Que eram muito mais do que amizade, amor ou companheirismo, mas algo sagrado.
O verão se foi, e o carregou consigo para novos horizontes, deixando-a ali, sozinha, ainda sob efeito de devaneios e ilusões de felicidade. O tempo passou até que ela pudesse finalmente despertar para sua nova realidade. Veio o inverno, e o que outrora era luz, estava vazio. Já não haviam mais passos na escada ou risos abafados. Também ficavam escassos os sorrisos e aos poucos desaparecia o brilho no olhar. Agora tudo que restava eram as lembranças descritas em páginas soltas sobre a escrivaninha, que guardavam cada momento daquele breve e inesquecível verão, e o desejo de que o próximo pudesse trazer de volta seu tesouro perdido.
O silêncio, que antes sempre fora seu maior refúgio, era agora seu calabouço…
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