Um terrível assassinato. Um homem inocente é condenado. Milagres acontecem.
“À Espera de Um Milagre” conta a história de Paul Edgecombe, um homem muito velho que passa seus longos dias no asilo Geórgia Pines, onde fará um mergulho à um passado de ódio, vingança e milagres, relembrando os também longos e surpreendentes dias em que foi chefe da guarda no Corredor da Morte da Penitenciária de Cold Mountain.
Durante o tempo em que viveu no Corredor da Morte, em meio à assassinos frios e cruéis, Paul conheceu todo tipo de gente e situação. Poderia passar a vida toda contando histórias sobre o “Quilômetro Verde” e a “Velha Fagulha”, mas nenhuma foi tão especial quanto à de John Coffey, o negro gigantesco que, inocente, acaba sendo condenado pelo assassinato de duas meninas, crime que não cometeu, mas, ao contrário, tentou desfazer. Coffey era como uma dádiva de Deus: ele tinha o dom de realizar milagres. Ele próprio era um milagre. Paul sofre por saber que ele é inocente e não poder agir. Ele conta com o apoio de seus fiéis homens Brutal, Harry e Dean, e de sua adorável mulher Janice. Além disso, precisa lidar com o indesejável Percy Wetmore, um guarda covarde e sem caráter, e acalmar os ânimos de outro prisioneiro, Billy The Kid, verdadeiro culpado pelo crime de Coffey.
Já velho, ao relembrar suas memórias, passado e presente se fundem, mostrando que o tempo passou mas as coisas não mudaram. Em Georgia Pines, Paul precisa lidar com Brad Dolan, uma versão de Percy Wetmore, e conta com o apoio de Elaine Conelly. Mas o que mais lhe aflige é sua longevidade, que, de alguma forma, lhe foi passada por Coffey. Paul já viveu demais, e agora anseia pela morte, que parece, enfim, se aproximar. E a única coisa de que tem certeza é que jamais esquecerá o ano de 1932: o ano de John Coffey.
Em uma trama cheia de ações físicas e psicológicas, Stephen King trabalha o imaginário do leitor através da viagem no tempo, detalhando situações e transpondo o leitor para a atmosfera do contexto, fazendo-o se aventurar junto das personagens. Sua linguagem é clara e objetiva, aproximando ainda mais o leitor da realidade ao apresentar aspectos do cotidiano aos quais muitas vezes fechamos nossos olhos, como a vida nas penitenciárias.
Alguns passam a vida toda cometendo crimes. Outros o fazem uma única vez. Mas o destino de ambos pode acabar sendo o mesmo: o Corredor da Morte. O livro retrata a vida dos prisioneiros no Corredor, o local mais delicado da penitenciária, onde os aspectos psicológicos são primordiais. Porém, mais delicada ainda é a questão da pena de morte, foco principal da história. Será que um homem inocente deve ser condenado? Será que a morte é punição ou libertação? São muitos os pontos a serem discutidos, seja em 1932 ou nos dias de hoje. Se por um lado, os criminosos devem pagar pelo que fizeram, por outro, até que ponto a morte é o preço ideal quando ela pode significar liberdade? Enquanto há muitos criminosos à solta, há muitos inocentes que pagam por crimes que não são seus. “Talvez a justiça seja realmente cega, ou então, não queira abrir seus olhos”.
Outro tema abordado no livro é a questão do preconceito. Se Coffey fosse branco, talvez lhe dessem a chance de um novo julgamento, mas ele era negro. E um “negro gigantesco” em meio à uma sociedade extremamente preconceituosa.
A essência da história, porém, encontra-se nos milagres de Coffey. Alguns de nós são agraciados por dons, que podemos usar par ao bem ou para o mal. Algumas vezes, podemos nos tornar escravos de nossos dons. Outras, eles podem significar, ao mesmo tempo, graça e sofrimento. Da mesma forma, milagres nos cercam. Milagres que cada um de nós vê de uma forma diferente, mas que estão lá.
O leitor tem muitos motivos para se identificar com a narrativa, que é intrigante e envolvente, que fala do bem e do mal, justiças e injustiças, e, sobretudo, fala de aspectos e sentimentos humanos, sejam eles raiva, tristeza, alegria, bondade, maldade, medo ou inocência, transmitidos através de personagens humanas e realistas, como o odiado Percy Wetmore, que representa a figura da maldade em pessoa.
Por fim, a história nos permite fazer uma reflexão sobre todas as coisas que nos cercam às quais não damos atenção; sobre como o ser humano é mais vulnerável do que podemos imaginar, usando como exemplo os condenados à morte, que em um momento são violentos e selvagens, e no outro, dóceis e frágeis. E assim, o autor faz também uma crítica à sociedade na qual vivemos e o modo como ela pode ser tão complexa e simples ao mesmo tempo. Aos poucos, ele abre novos horizontes para que façamos uma reflexão sobre nossas próprias vidas.
Uma obra emocionante, “À Espera de Um Milagre” vai muito além das grades do Corredor da Morte, da força da Velha Fagulha; muito além do tempo. É uma história sobre o homem, suas atitudes, e os milagres que o cercam.